A princípio, dependendo da percepção e ambiente em que reside/cresceu/vive, o leitor poderá achar que este livro trata sobre algo erótico ou mesmo fortemente sexual. Mas engana-se quem pensa assim.
De autoria de Rupi Kaur e publicado no Brasil pela editora Planeta, "Outros jeitos de usar a boca" é um livro de poemas que mostra de maneira muito bem elaborada a história de vida da autora.
Claro, que não é explícito e conforme vamos lendo vamos percebendo nas entrelinhas que seria mais ou menos isso.
Os poemas são todos narrados em primeira pessoa e são complementados por ilustrações simples e belas que retratam muito bem determinadas passagens.
Em vários momentos a autora é dura em suas afirmações...
"Não fui feita com leveza na língua
para que fosse fácil de engolir
fui feita pesada"
O que podemos perceber com a leitura dos poemas é que a autora fora abusada sexualmente por parentes ou mesmo pelo seu pai.
"nossos joelhos
arreganhados
por primos
e tios
e homens
nossos corpos manipulados [...]"
O pai é um ser que subjuga a família e de maneira muito forte a mãe, estando essa muito submissa ao marido.
"mulheres da minha família
aprenderam a viver com a boca fechada"
"não sei dizer se minha mãe está aterrorizada ou apaixonada pelo meu pai
parece tudo a mesma coisa"
Essa é uma referência não só à família de Kaur, mas a como várias mulheres ao redor do mundo têm sido tratadas por várias gerações, sem direito a se expressarem, sempre submissas, até mesmo fazendo sexo como uma obrigação, sem vontade...
A conceituação da família, bem como a relação da criança (dela no caso) com os pais, muitas vezes dita como comum ou normal, é bem ácida...
"Você é uma guerra
a fronteira entre dois países
o dano colateral
o paradoxo que os une
mas também os separa"
Ao longo de sua jornada ela se torna independente, conhece alguém, onde começa um relacionamento, porém este é marcado por vários términos e voltas, até a paixão terminar e o relacionamento, antes tão belo, ter seu fim.
"Eu estaria mentindo se dissesse
que você me deixa sem palavras
a verdade é que você deixa minha
língua tão fraca que ela esquece
a linguagem que fala"
Há, então, um período de esquecimento do parceiro; relaciona-se com outros, mas não é a mesma coisa. Passa a se aceitar como é, independente do que outros acham de si, passando a ser, ao final do livro, a melhor amiga de si mesma.
O livro faz ressurgir vários pontos muito importantes para a reflexão feminista: que as mulheres devem se dar mais respeito, que muitas vezes estão em guerra com o que há de mais natural nelas (aqui são mencionados a remoção de pelos, menstruação etc) e que elas devem ser elas mesmas.
"pelo
se não era pra estar aqui
não cresceria
em nosso corpo pra começo de conversa
estamos em guerra, com o que há de mais natural em nós"
E a grande mensagem, que não fica restrita ao feminismo, é a importância do amor. Nada importa se não o amor...
Fica aqui a minha indicação para esse livro de poemas muito rico em detalhes em que o processo de leitura é muito rico e vale a pena ser vivenciado.
O que você achou? Comente e compartilhe! Até!
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